Como aprender a Ser Professor

A temática da presente reflexão prende-se com a problemática de como é que se aprende a ser professor, ou seja, se este é um processo que decorre ao longo da vida ou se tem apenas início no momento de formação inicial.

Ao longo do ano fomos incitados a reflectir e a explicitar algumas particularidades que caracterizam um profissional e, em particular, um profissional docente. Algumas das inferências iniciais resultantes deste processo reflexivo derivaram, sem dúvida, das experiências decorrentes dos anos em que fomos alunos e do consequente contato com diferentes tipos de actuação e múltiplos métodos de ensino por parte dos professores (Lortie, (1975) cit, Flores, 2006, p.173).

Esta familiaridade com o contexto da sala de aula resulta então na construção de um conjunto de crenças que acabam por influenciar a nossa visão relativamente ao conceito de bom professor. Estas concepções vão ganhando forma e fundamento ao longo do tempo, sobretudo, durante formação.

Tendo em consideração o que foi dito, Nóvoa procurou identificar cinco facetas que definem o «bom professor»: conhecimento, cultura profissional, tato pedagógico, trabalho em equipa e compromisso social. Estas “disposições” citadas pelo autor constituem uma compilação simplista e estruturada da lista de competências que fui formulando ao longo semestre, e permitiram-me, naturalmente, fugir ao senso comum.

Assim sendo, a citação de Alain (1986) cit. por Nóvoa (s/d), p.3  “Dizem-me que, para instruir, é necessário conhecer aqueles que se instruem. Talvez. Mas bem mais importante é, sem dúvida, conhecer bem aquilo que se ensina“ apresenta, na minha opinião, dois aspetos fundamentais para se ser um Bom Professor de Educação Física: “conhecer aqueles que se instruem” e “conhecer aquilo que se ensina”. O primeiro aspeto salienta a necessidade de um bom Professor conhecer a turma como um todo, sem contudo desvalorizar as especificidades de cada aluno.

Evocando o segundo aspeto, ninguém ensina aquilo que não conhece, aquilo que não domina. Neste sentido, um bom professor deve possuir um conjunto estruturado de conhecimentos, que lhe permita compreender profundamente aquilo que vai ensinar. É assim essencial ser especializado na área para, desta forma, conseguir construir práticas docentes que conduzam os alunos à aprendizagem.

No ensino, as dimensões profissionais cruzam-se inevitavelmente com as dimensões pessoais. Portanto, um bom professor deve preparar também um trabalho sobre si próprio, através da auto-reflexão e da auto-análise para, desta forma, desenvolver capacidades de relação e de comunicação, que acabam por definir um aspeto muito importante que influencia todo o processo de ensino-aprendizagem, o tato pedagógico. Este é o ingrediente chave para saber conduzir alguém para a outra margem, o conhecimento (Nóvoa (s.d.)).

Um Bom Professor deve compreender também os sentidos da instituição escolar, integrar-se numa profissão, aprender com os colegas mais experientes. É através da interacção com os outros professores que se aprende a profissão. Para tal, o processo reflexivo é indispensável para o aprimoramento e para a inovação. 

Hodiernamente sabe-se que a atividade pedagógica desempenha um papel social importante no fenómeno educação. O professor assume-se assim como um agente da e na sociedade capaz de moldar o comportamento dos indivíduos, ou seja a sua actuação vai para além da sua capacidade de ensinar conhecimentos específicos relativos a uma determinada área científica. Este também desempenha um papel importante na transmissão de valores, normas de conduta e princípios, que possibilitam a integração dos alunos na escola mas, sobretudo, na sociedade.

Um bom Professor deve saber trabalhar em equipa e intervir conjuntamente nos projectos educativos da escola. O exercício profissional organiza-se, cada vez mais, em torno de «comunidades de prática», no interior de cada escola, mas também no contexto de movimentos pedagógicos que nos ligam a dinâmicas que vão para além das fronteiras organizacionais (Nóvoa (s.d)). Apesar desta colectividade ser praticamente indissociável da profissão, é também necessário ser autónomo, criativo e inovador.

O estereótipo do “Bom Professor” tem, na minha opinião, influência na forma como concebemos a formação e o momento de indução profissional. Desta forma, o professor principiante procura imprimir na sua prática docente atitudes e valores mais ou menos progressistas, interiorizados ao longo das experiências escolares prévias e durante a formação inicial (Flores, 1999).

No entanto, a primeira dificuldade dos professores neófitos pode decorrer desta familiarização com o contexto escolar. “O choque surge quando professor principiante deixa de ser a audiência e passa a ser o actor. O papel que vira ser interpretado vezes sem conta é agora seu. A cena familiar da sala de aula é invertida e encontra-se numa situação nova surpreendente" (apud Arends, 1995, cit. Flores,1999, p. 177).

Neste contexto, como advoga Nóvoa, a formação de professores deve ser construída dentro da profissão, ou seja, baseada na combinação complexa de contributos científicos, pedagógicos e técnicos, mas que tem como ancora os próprios professores, sobretudo os professores mais experientes e reconhecidos.

Assim sendo, a formação dos professores deve conter um forte referencial didático, pedagógico e profissional e um período probatório, de indução profissional, que é indispensável para a transição aluno-professor. Este momento é intitulado “choque com a realidade” e traduz "o colapso entre os ideais missionários elaborados durante a fase de formação e a crua e dura realidade da vida quotidiana da sala de aula" (Veenman (1988), cit. por Flores, 1999,p.174)

          E m suma, as nossas conceções relativamente à docência vão se construindo e evoluindo ao longo do tempo, porém os ingredientes base para se ser professor são fornecidos durante a formação e são posteriormente aplicados no contexto escolar, no momento de indução profissional. No fundo, é o contato com professores mais experientes e com a realidade escolar que fomentam a construção e aquisição da cultura profissional.

 

BIBLIOGRAFIA

Flores, M. (2006).Desilusões e paradoxos: A entrada na carreira na perspectiva dos professores neófitos. Revista Portuguesa de Educação, 12(1), 171-204.

Nóvoa, António (s.d.). Para uma formação de professores construída dentro da profissão. Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.